terça-feira, 28 de maio de 2013

Amado Batista: o justo torturado?

Amado Batista: o justo torturado?

A entrevista que o cantor Amado Batista deu a apresentadora Marília Gabriela tem dado o que falar (trecho do vídeo disponível abaixo).  Depois de ouvi-lo, como poderíamos identificá-lo? Alienado, ignorante político, manipulado, aproveitador? Na verdade, não importa a classificação. O que realmente importa é como esta situação inusitada, de um torturado/vítima se identificar com o seu algoz/torturador, nos dá muitos elementos para reflexão.
            Entendeu ele, num dado momento da vida, que ao vender livros - aqueles objetos que distribuem conhecimento e que por excelência tem a função de disseminar ideias e culturas proibidas (Jorge Amado, Che Guevara...) - para professores e intelectuais, estava fazendo algo ruim. “Estava apoiando pessoas erradas que queriam tomar o poder a força”

Dois destaques sobre sua fala.

Primeiro, ele considerar que é errado tomar o poder a força, mas acreditar justo que os militares tenham feito exatamente isso. Diz ele, “o governo estava se defendendo de gente que queria tomar o país a força”.  Estarrecida com a afirmação Marília Gabriela pergunta: “Amado, você passou para o lado de seus torturadores?” Não, é claro que não. Para isso ele precisaria minimamente entender do que se trata tudo aquilo, as correlações de força em jogo. Não é o caso. No máximo ele expressou a máxima do senso comum: “podíamos ter virado uma Cuba!” Aqui aparece a velha desculpa de que fizeram isso para evitar o mal maior, á saber, a revolução comunista (a velha paranoia). Ele condena “aquelas pessoas” [a esquerda]. Mas senhor Amado Batista, isso o que está defendendo quando diz “se nós queremos democracia, não é dessa forma (sic)... tem que ganhar democraticamente” é o oposto que seus algozes defendem. DITADURAS E OS QUE AS SERVEM, SEJAM DE DIREITA OU ESQUERDA, NÃO COSTUMAM SER FAVORÁVEIS A DEMOCRACIA, LIBERDADE DE EXPRESSÃO E LIVRE PENSAMENTO. EXATAMENTE POR ISSO TOMARAM A FORÇA (E COM VIOLÊNCIA) O PODER DO ESTADO. A contradição é latente.
O segundo destaque, e a meu ver, a pior parte da história, é ele acreditar que os militares estavam certos e dizer que foi merecedor da tortura, ou seja, como culpado a tortura é justa.  “Me bateram muito. Me deram choques elétricos”, recorda que ficou dois meses sob muita tortura física, psicológica e ameaças de morte. Ficou muito atordoado e que chegou a pensar em largar tudo e virar “andarilho”, e só se recuperou porque tinha estrutura familiar. Mesmo assim, acha justo, segundo sua lógica – “foi uma justa correção! A tortura é justificável”. Novamente Senhor Amado Batista: poder desse tipo: VIOLENTO, USURPADOR, QUE IMPEDE A CULTURA, CONHECIMENTO, LIVRE PENSAMENTO E EXPRESSÃO, E QUE BENEFICIA POUCOS, não se justifica.
Não importa o grau de miopia alienante do senhor Amado Batista ou quais são as suas justificativas recheadas de senso comum. Homens foram torturados, espancados, assassinados. Mulheres foram torturadas, estupradas e assassinadas. E nada, absolutamente nada justifica tal “corretivo”. E mesmo falando tantos impropérios, por favor, lembrem-se, o cantor, natural de Catalão, é a vítima e não o criminoso! Fez uma coisa maravilhosa e letal, forneceu livros!



9 comentários:

  1. Concordo e vejo que, como ele, devem haver dezenas de pessoas que receberam tais sofrimentos e ainda sim, por estarem errados, vejam a figura dos milicos como esse "pai que corrige".

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    1. É marcante essa ideia do "pai que corrigi" como se o Estado tivesse e papel na vida das pessoas. A submissão ao Estado é forte e a crença de que ele tudo pode é algo ainda a ser descontruído.

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  3. O assunto é muito intenso, aparentemente fácil de dissertá-lo, mas certamente uma armadilha que em "nada" (provocação minha ao debate) lhe escapa.

    A busca pela violência para a implantação de um regime, seja qual for, com o apoio de quem quer que seja, por quais razões ou ideologia que acharem a mais conveniente, torna o processo de "tomada", ou "transição", uma "sangria" silenciosa ou, como propaganda, ruidosa para que todos tenham o exemplo do que "não se deve fazer", ou, "não mexam comigo, porque se não, olha o que acontece"...

    Ele, Amado Batista, não é singular, ele é um dos tantos que, embora, talvez não tivesse "uma hiperintelectualidade", ainda assim, seria a "mediana", somado "aos bens" (lojas = dinheiro = 'status')pois como disse ele "trabalhava em umas lojas", que precisava manter, então, sua vida,à época do acontecido, talvez ele preferisse assim, deveria continuar a mesma... Ora, quantos assim não se comportaram?! Quando ele percebeu que de nada importava sua condição de trabalhador em lojas, se é que eu entendi bem isso, pois ele não fala que são dele, ele diz, que trabalhava com as lojas, por favor me corrijam se me enganei, mas ainda assim, vale para as duas formas, como proprietário ou como empregado, mas que ganhe o suficiente para lhe dar esse tipo de "comodidade social", pois então, quando percebeu que para os que ocupavam ou eram próprio "Estado", a manutenção do regime vigente era mais importante que a crença dele, sua posição social e seu saber. E custasse o que custasse para que isso ocorresse. Aqui, esse custasse o que custasse, soa como um eco...

    Vou fazer uma provocação bem irresistível, amarga, sepulcral, com cheiro de enxofre... Nunca, mas nunca mesmo, se torturou e se matou, neste país, como nos tempos de hoje. Com a mesma anuência "daqueles tempos"... Nunca se citou o quão bom foi o tempo da "ditadura" como nos tempos de hoje...

    A sociedade, hoje (80, 90, 2000, 10) esta que se mistura com a sociedade de ontem (anos 40, 50,60, 70),assim defini para este texto, o ontem e o hoje, são quase uniformes em dizerem que aplicar castigos "severos" aos que não conseguem se ajustar ao meio social em que vivem é correto, é o que se deve fazer, ou até mesmo tirar vidas.

    Afirmo categoricamente, que nunca, mas nunca mesmo, torturou-se tanto, como nos dias de hoje neste país. Vejam, eu fiz mais uma vez essa afirmação.

    Precisamos olhar como uma clareza ímpar, técnico de pesquisadores e humanistas sobre os "fatos históricos".

    Esse senhor, Amado Batista, era mais um dos que ontem viviam, mas não só ontem, mas um dos que hoje vivem também, e que estão se formando, jovens, imersos em idéias que se quer vivenciaram e vivenciam ou aplicam no seu dia a dia, mas que cultuam e aplicam "aos outros", e isso defendem com "unhas, garras e dentes" (ditadura nas suas diversas formas).

    Hoje, tortura-se com uma naturalidade infernal, com um cinismo e amparo intelectual maquiavélico (Henri Kissinger), e com um sadismo que deveria ser intolerável. Mas o bom, é dizer que tudo isso está errado nos meios midiáticos, mas intragoverno, mas dentro de nossas casas, mas nas repartições das empresas, ou, quando usamos os meios "simulados de democracia" para combater todo esse tipo de náusea "imoral", percebemos que esse meio é a nata de tudo aquilo que queríamos reprimir... (continua)

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  4. (continuação)
    Hoje, 2013, no vigésimo nono dia do mês de maio, se tortura mais que nos tempos idos...

    Notícia, ontem, dia 28 de maio de 2013, no noticiário da teve Record, Marcelo Rezende (não sei se é assim que se escreve o nome dele)apresentador de conhecido "programa 'jornalístico' de polícia", de grande audiência, que causa transtornos à Rede Globo, apresentou uma matéria, onde o indivíduo, ali demonstrados como autor de algum tipo de ilícito penal, estava com a face lesionada. O apresentador, de maneira muito clara, acompanhado do senhor especialista criminal, Persival de Souza, outro "ícone desse tipo de jornalismo e um especialista em 'direito penal',assim é apresentado ou reverenciado", ao ver as lesões na face, na boca do indivíduo, dizia então: mostra lá, ali, mostra aí o machucado na boca, vocês (falando com os telespectadores, explicando), sabem como ele conseguiu esse machucado né, os 'polícias' (pois assim se autodenominam os policias e também, da mesma forma esses apresentadores como toda a sociedade, não não como os 'policiais') devem ter dado corretivo,..." aqui retomo, vejam, não importa, se nesse caso, foram os policias ou não, e sim, como ele e outros apresentadores de outras emissoras, demonstram casos como este,todos os dias, e isso há muito e muito tempo mesmo. Esse Marcelo Rezende,antes postulava que era contra a pena de morte, agora, é declarado, em seu próprio programa, um fiel devoto a favor dela, e convoca todos a essa causa, com seus argumentos ali explanados. O que quero dizer é que esses programas tem uma audiência que dá trabalho para as outras emissoras que transmitem outros tipos de programas neste horário. Então, conclui-se, as autoridades sabe que há tortura e castigos físicos com intuitos diversos por parte dos policiais, os órgãos hierárquicos das polícias, civil e militar, sabem que houve, as vítimas do infrator sabem que o infrator foi torturado, os familiares do infrator também sabem, e tudo isso é apresentado para milhões de brasileiros em rede nacional, e possui "UM GRANDE SUCESSO DE AUDIÊNCIA". Só é feito alguma coisa, se algo der errado, se a pessoa que sofreu a tortura, é um dos que participam da mídia, ou da elite branca, ou mesmo, quando é o seu familiar (aqui, digo, familiar seu, leitor, familiar meu e assim por diante) que sofreu este tipo de abuso. Ou seja, um do próprio povo que assiste e dá audiência e ainda por cima, concorda com "correção desferida ao infrator", claro, desde que não seja com seu familiar.

    Ainda hoje, utiliza-se muito mais do que antes, meios de condução elétrica para fins de tortura. Hoje se compra lanternas "made in China" com tais dispositivos que seriam para autodefesa,claro que muitos tem comprados para outras finalidades, principalmente no meio policial. Se bem que, antes da chegada de tais produtos, ou seja do "esparrame deles", sempre houve um fio condutor de eletricidade e uma tomada elétrica em qualquer delegacia e posto de Polícia Militar. Claro que, não é só instrumento de tortura a eletricidade, são os bastões, porretes, pedras, alicates, facas, armas com ou sem munição que são apontadas ou encostadas ou postas dentro da boca e "engatilhadas" e por aí vai... Li uma pesquisa sobre tortura, um dos temas que pesquiso, nela foi um torturador especializado, treinado, que disse a sobre a função da tortura. Explicou desta forma: Introduzíamos no seu anus (perdoem-me este tipo de relato, mas creio necessário)uma garrafa de coca-cola. Mostrávamos para a pessoa torturada a garrafa antes. Assim, se não a matássemos,ela, em qualquer parte do mundo, depararia-se com uma garrafa de coca-cola, ou o nome coca-cola, e lembraria-se do que somos capazes, e temeria". Uma pena não tê-la em mãos para citá-la, foi há muito tempo, e nas minhas mudanças de casas as perdi, não era tão informatizado como hoje. Mas acredito que é possível encontrar algo do tipo pela internet hoje. (continua)

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  5. (continuação)
    Perguntar-se-hão qual a razão de eu assistir esses tipos de programas, e logo poderão concluir, então, que sou mais um desses. Respondo,é, pode ser, mas na verdade tenho que assistir porque faz parte de minha profissão... Os estudos das informações é um outro campo meu...

    Muitas vezes quando estou em um coletivo, ouço dos passageiros falando entre si, comentando sobre algum acontecido, e tão logo vem à tona essa frase: na ditadura isso não acontecia... e por aí vai essa linha de pensamento. Quando me indagam sobre algum tipo de ocorrido propagado pela mídia, ou mesmo ele próprios testemunharam, logo vem a frase...se na ditad...

    No meu serviço então, não preciso nem dizer... muitos são pró a ditadura... bom mas qual a idade deste povo pró a ditadura?... sinto informar aos mais afoitos, a idade é em entorno de 50, 40 à (pasmem vocês) 20 anos (esses são muitos), eles estão entrando no serviço agora e já vem com esta mentalidade, como esse preconcebimentos de idéias...sequer vivenciaram como eu, que possuo 42 anos, o tempo intenso de ditadura... mas ainda assim discursam em seu favor... claro, não é necessário vivenciar um tempo para se saber sobre ele, se é "bom ou ruim", mas o quero dizer é que nesse caso, há um defesa da ideia, há uma "prática" em prol desta "ideia"... Há uma disseminação dessas ideias. Todos sabem e nada fazem. Vimos já isso antes não é!!!...
    Quero ressaltar como disse ali, o senhor Amado Batista, havia pessoas que liam os “livros proibidos”, daí vemos que há uma porção (aqui no sentido de dizer punhado, não de poucos ou muitos, mas uma parcela de) da sociedade que buscava certas leituras, no caso, anteriores e derivados, posteriormente de Carl Marx. Denota-se então uma efervescência da intelectualidade buscando, talvez, uma sociedade diversa daquela que se lhe apresentavam, um mundo novo ou, ao menos, melhor. Por outro lado, também é fato que havia muitos intelectuais a favor do regime vigente. Eram conhecedores do que se passava e davam apoio total ao que acontecia... claro, enquanto era a seu favor... mas havia mesmo aqueles que acreditavam o que era melhor “para o seu país” (não discuto no momento o que de fato era melhor e sim os meios para se chegar a isso, e, que não seria algo novo, e pela última vez, ou ainda, um mero acaso, apenas observo o ontem e o hoje, na medida do possível).
    (continua)

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  6. (continuar)

    Aqui, de certa forma, concluo a respeito do parágrafo acima, a intelectualidade não exime práticas consideradas, em certos tempos, execráveis e hediondas, isto, quando eles mesmos não a cometem, como muito já ocorreu antes e ainda ocorre hoje, depende apenas da motivação, seja qual for.
    Então, devemos buscar o mais fundo possível, dentro dessa sociedade que quer pousar uma análise sobre esses tempos idos tão presentes no hoje..."como se isso não ocorresse mais".
    A MÍDIA É BRANCA...A TORTURA NÃO FOI, E NÃO É SÓ DOS MILICOS, OS MILICOS PERTENCEM À UMA SOCIEDADE, EMERGIRAM DELA, SANGRARAM DELA, TÃO ALIENADOS, HIERARQUIZADOS E SEGMENTADOS EM ESTRUTURAS SOCIAIS (DE OFICIAIS AOS PRAÇAS, MAS NÃO TÃO SIMPLES ASSIM) QUANTO ELA, NO ONTEM E NO HOJE...OS MILICOS SÃO UMA PEQUENA PARTE DE UM GRANDE TODO...HÁ UMA MIRÍADE DE POLÍTICOS, "CORONÉIS DE POLÍTICA", JORNAIS, EMPRESAS E EMPRESÁRIOS, EMISSORAS DE TV... QUE AÍ ESTIVERAM JUNTOS ATÉ O FIM COM TODA ESSA "SUJEIRA" (DITADURA,AQUI NÃO DISCUTO SOBRE O CONTEXTO SOCIAL E POLÍTCO, APENAS SOBRE AS MORTES)... É IGNORARMOS ISSO, É REALMENTE NÃO SERMOS PESQUISADORES, É NÃO SERMOS HISTORIADORES... NÃO SERMOS O QUE GOSTARÍAMOS OU O QUE DIZEMOS QUE SERÍAMOS OU SOMOS.
    Isso, do que falamos, é uma pequenina vírgula dentro dos textos contidos nos volumosos livros com diversos números da história de nosso país, tão cheia de parênteses, de "se nãos", "mas", "mais", "contudo", etc...
    E cheias de "Amados Batistas"...
    Por isso, abramos os olhos e pesquisemos mais e fundamentalmente, nos movimentemos mais em direção da formação de uma sociedade mais justa, dentro do que assim acreditamos possível isto...

    Peço desculpa pelos erros de português...

    Cenol Marques Rodrigues Junior

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    1. Cenol, volto a ressaltar que fico muito feliz de perceber seu crescimento intelectual e sua lucidez. Concordo com seus termos e principalmente com o fato de que é por tudo isso que precisamos pesquisar mais e chafurdar nesta sociedade até compreendermos melhor.

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    2. http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/05/1285003-minha-historia-fui-torturada-em-1970-e-denunciei-o-coronel-ustra.shtml

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