sábado, 4 de maio de 2013

AMIGOS, CACTOS E LIVROS


 Tenho amigos negros maravilhosos, inteligentes e bonitos. Tenho amigos negros safados também. Conheço negro escuro, escurão, mais claro, marrom. Tenho amigos negros que estão entre os meus melhores amigos! Tenho amigos que são irmãos. Irmãos de vida, de coração e sentimento. Tenho amigos que deixei pra lá. Deixei pela vida. Mas tem amigos que a vida deixou e mesmo assim continuam a serem meus amigos. Independente de quanto tempo se passou... Tenho amigos nordestinos. Conheço nordestinos de nascença e por herança. Até namorei um. Tenho amigos gays que sabem e assumem, tenho amigos gays que sofrem para assumir. Tenho amigos gays que não ligam a mínima para os outros. Tenho até um que adotou um filho. Lindo! Tenho amiga lésbica que é feliz e prefere parecer um homem, mas tenho amigas lésbicas femininas, meigas e decididas. Tenho amigas lésbicas que se descobriram depois de muita experiência e tenho outras que sempre souberam! Tenho amigos brancos de todas as variações: branco-neve, branco-amarelado, branco-esquisito e branco-branco e tenho amigos que quando as veias coloridas aparecem ficam rosados. Eu sou branca-rosada-amarelada. Conheço branco-branco que casou com negro-negro. Conheço branco-amarelado que casou com marrom. Vixi, esse tópico não acaba mais por que a gente se mistura mesmo! Ainda bem!
            Tenho amigo que é branco que parece japonês, mas é brasileiro e dizem na verdade que o certo é amarelo. Tenho amigo japonês branco-amarelo que vai e volta do Japão e tenho amigo japonês branco-amarelo que nunca foi ao Japão.  Tenho amigos magros e gordos, e também os que engordam e emagrecem. Conheço amigo magro que casou com gordo e amigo gordo que casou com gordo. E magro que casou com magro, separou e depois casou com gordo. Conheço gente que não casou, sofreu e depois resolveu não casar mais. Aí parou de sofrer. Tenho amigos que tiveram filhos e outros que decidiram não ter. Conheço gente de todas as religiões: budistas, católicos, católico não praticante, católico intenso, católico carismático (e alguns não tão carismáticos assim...). Evangélicos de todas as mais de mil igrejas que conheço e umbandistas também. Conheço gente do candomblé, exotéricos, muçulmanos, judeus de barriga e convertidos, testemunha de jeová, seicho-no-ie, ateus, agnósticos. Conheci até um cara do santo daime. Mas não mudei minhas convicções por nenhum deles.
 Conheço amigos rabugentos e que a “cara amarrada é só um jeito de viver na pior”, como diz a letra da música. Tenho amigos de uma vida inteira. Tenho amigos que em pouco tempo se tornam amigos. Tenho amigo só pelo computador: das redes sociais ou por e-mail. Porém, pela proximidade de quem somos a distância desparece! E tenho amigos que não são amigos “de verdade”, mas as redes sociais classificam assim.
Conheço gente que fez uma burrice na vida, que fez algumas burrices e outros que fizeram muitas burrices. Alguns aprenderam que todo mundo erra e aprendeu a perdoar para ser perdoado. Conheço gente que quando magoado não perdoa nunca mais e ninguém. Tem medo de perdoar e fazer papel de tonto! Tem gente que não perdoa porque diz que nunca é perdoado. Mas talvez na verdade é que não consiga se perdoar também... Conheço gente atrapalhada. Vive na confusão e dando jeitinho. Conheço gente sempre certinha. Conheço gente com mania de limpeza. Conheço gente que vive na desorganização e tudo bem. Tenho amigo reacionário, não convivo, mas tenho. Tenho amigo preconceituoso – aguento por um tempo e tento ajudar na mudança. Se não dá, deixo pra lá. Tenho muitos amigos militantes. Que acreditam numa causa e lutam. Esses são feras. Tenho amigas que são pra qualquer coisa a qualquer hora, às vezes damos um tempo e depois tudo é como sempre foi. Tenho até amiga que entra na “ostra”, mas depois sempre volta. Conheço gente que veio pra brilhar: todo mundo adora e onde passa faz sucesso. São na maioria professores e artistas. Conheço gente antipática, que pra conquistar precisa de um tempo. Conheço gente teimosa. Xiii! Conheço bem...    
Conheço gente que odeia berinjela (eu, por exemplo) e conheço gente que adora. Conheço gente com muito cabelo, pouco ou sem nenhum, careca mesmo. Conheço gente que adora plástica, tecnologia e modernidade e tenho amigos que odeiam tudo isso. Conheço gente que adora – e por que o tempo passa - adorou acampar e viver a natureza: mato, cachoeira e praia deserta. Eu vivi muito isso. De trem em trem com muitos amigos. Mas tem gente que só gosta de shopping: um bom restaurante, um cineminha e uma boa conversa fora com café. Adoro isso também! Também conheço gente muito-muito bonita, de dar gosto. Conheço gente mais ou menos ou comum. Conheço gente feia também. Mas tudo depende da época: tem gente feia que virou bonita - o contrário também - por que quando o tempo passa as coisas mudam e a estética também! Tem gente que eu acho linda e os outros acham feia... vai entender? Tenho amigos que adoram música, tem milhares de discos e tem um gosto fabuloso. Conheço gente que não gosta de samba, não gosta de rock ou não gosta de MPB. Conheço muita gente que não gosta de sertanejo, esse novo, não aquele bom e velho de raiz. Conheço gente que bebe um pouco, que não bebe nada, gente que bebe socialmente e gente que bebe muito.... Até não se reconhecer mais!
Conheço palmeirense, são paulino, santista, gremista, colorado, gente até que torce pro Juventus da Itália e Juventus da Mooca. Conheço gente que não torce pra ninguém e não gosta de futebol. E gente que só torce pra seleção brasileira ou argentina. Ah! E conheço muitos corintianos.... Eu, por exemplo, né? Tem amigos que adoram praia, outros o mato, e outros ainda, os dois. Tenho amigos urbanoides. Tenho amigos comunistas. Tenho alguns capitalistas por convicção. Mas a maioria nem sabe o que isso tudo quer dizer de fato! Não tenho nenhum amigo nazista, fascista, skin-red, integralistas ou qualquer porcarias dessas. Mas os conheço. Às vezes tive que explicar por que não podiam ser meus amigos: não é questão de diversidade e sim de incoerência. Tenho amigos varguistas, lulistas, chavistas, brizolistas e infelizmente stalinistas, mas com estes, não convivo também. Tenho amigos que gostam muito de mim, outros mais ou menos e outros que me demitiram pra sempre. Você já foi demitido por um amigo? É triste, mas compreensível, às vezes a gente pisa na bola mesmo. Mas tenho amigos (uma meia dúzia) que se me demitir vou de joelhos implorar perdão...porque sem esses eu não vivo! Não tenho amigo que se “foi” e nem quero pensar em como vou reagir quando isso acontecer! Tenho amigos que eu nem sei que sou amiga, mas me consideram assim.
 No ano que vem comemoro 20 anos de sala de aula. Tenho alunos de todos os tipos: os que me amam ou odeiam. Tenho os que me odiaram e um dia passaram a amar (acho que o contrário também). Não tenho ex-alunos. Tenho os que me acompanham há muitos e muitos anos. Que viraram amigos e tenho os que de longe ainda me admiram. Conheço gente de muitas tribos, intelectuais, indígenas, comerciantes, estudantes, músicos, operários, advogados, artistas, professores, jornalistas, camponeses, ecologistas, homossexuais, feministas, pacifistas, comunistas. Nas minhas andanças conheci gente sem casa, sem comida, sem esperança. Na Amazônia conheci gente que nunca andou numa escada rolante ou num elevador. Que nunca viu um prédio com mais de três andares e não conhece o mar.
Tenho amigo branco, baixo, negro, gordo, marrom, nordestino, alto, gay, bonito, amarelo, feio, ateu, misturado, lésbica, religioso, diferente, igual, politizado e os “não tô nem aí”. E todos eles pertencem ao mesmo mundo imperfeito que temos. Tenho tantos amigos diferentes que é impossível pensar igual a todos e por isso acho que são meus amigos. Tenho até amigos não humanos: meus cães, gatos, cactos e livros. Estes me acompanham onde quer que eu vá!
 E ao pensar em tudo isso aqui fico feliz!
Apesar de tudo, é nesse mundo diverso que eu vivo e luto pela diversidade humana. Como diz o Subcomandante Marcos (muitas vezes citado) “a humanidade vive no peito de todos nós e, como o coração, prefere o lado esquerdo”
Viva o pluralismo, a diversidade e a humanidade!

Um abraço de amiga.
“A dignidade é essa pátria sem nacionalidades, esse arco-íris que também é ponte, esse murmúrio do coração sem importar o sangue que o vive, essa rebelde irreverência que burla fronteiras, alfândegas e guerras. A esperança é essa rebeldia que rejeita o conformismo e a derrota” (Subcomandante Marcos - EZLN)


9 comentários:

  1. Nossa.. Amei... Só que vou cobrar participação por inspiração... kkkkk

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  2. Acho que esse é o tipo de texto que merece ser lido em diversos momentos da vida, e em cada um deles tiramos uma conclusão. A minha de hoje foi: pensando bem, até que viver é bom.

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    1. Acho que é isso mesmo Camila: em cada fase da vida sensações e sentimentos diferentes. Vamos pensar no que temos pra agora.

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  3. Puxa vida Lilian, parece que você anda lendo minha mente..rs Em um momento em que eu me questionava sobre as relações de sociedade e até mesmo entre as pessoas que amamos, leio esse texto. Incrível, pois ele me fez pensar: ainda que alguns estejam tão distante das minhas convicções e valores, viver é bom. Mesmo que tenhamos que enfrentar os cactos.
    Grande beijo

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    1. Estamos o tempo todo entre a descrença e a esperança. É uma gangorra...de fase em fase mudamos de acordo com as situações. Mas no balanço das coisas ainda estou na fase: esse negócio ainda vale a pena!

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  4. Emocionante... lindo texto... sei que estou em alguma ou algumas partes dele... Mas a que mais me chamou atenção, talvez por ser recente é a de ser demitido por amigos (recente tem mais de um ano, mas qdo a gente perde quem ama uma década é pouco)... Infelizmente se ajoelhar e implorar perdão não foi suficiente, e concordo com vc onde:

    "...outros que me demitiram pra sempre. Você já foi demitido por um amigo? É triste, mas compreensível, às vezes a gente pisa na bola mesmo. Mas tenho amigos (uma meia dúzia) que se me demitir vou de joelhos implorar perdão...porque sem esses eu não vivo! ..." As vezes por mil motivos a gente tem que aprender a viver sem... as vezes o perdão mesmo implorado não tem efeito... e nem é preciso um grande motivo pra isso... Talvez o medo seja a resposta pela demissão... medo de não saber lidar com certas situações e da intensidade das mesmas... Acho que sempre fui intensa... creio que vc me conheceu assim... cheia de amor e cheia de dor... Ainda sou esse ser imperfeito e profundo, mas quando vc foge ao padrão no início essa intensidade é "encantadora", mas qdo vc afunda "muitas" pessoas fogem... pq? tbm não sei... medo? talvez essa seja uma resposta... milhões de medos.. medo de não saber lidar com algumas situações, medo de sofrer, medo de perder... medo medo medo...

    Quando nos encontrarmos o café vai ser longo... depois de tatos anos... meu eterno anjinho da guarda (mesmo sendo atéia Rs!)
    Beijão Gre

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    1. Querida, suas palavras são a reflexão que eu acho que todos nós fazemos ou faremos um dia. Sua imperfeição é como de todos nós. Mas sua humanidade é perfeita. Um grande beijo.

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  5. Lilian, o meu amor é branco amarelado e verde :) , minha avó é cinza com marrom, eu tenho os dentes amarelinhos, eu sou meio café com mais leite..olha que show! o problema é saber interagir, no dia a dia, com tanta diversidade..eu acho, mas enfim, achei lindo o seu texto, e viva a diversidade.

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    1. Meio café com leite é ótimo. O difícil mesmo é viver em sociedade não é?

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